A Real Despedida

É engraçado quando não sabemos que o último dia será realmente o último. Acabei acordando atrasado (será que eu desliguei o relógio ?) pois tinha marcado com a Alice e a Erli de irmos até um ninho de skuas em Punta Plaza, saída às 07:15 hs. Não sei por qual motivo mas acabei desligando o despertador antes da hora e só fui levantar as 08:15 hs, meio assustado. Ninguém tinha saído da estação por conta do vento forte que batia naquela hora, portanto, eu poderia muito bem ter ficado na cama até mais tarde.

Mas então o tempo melhorou, e como num ensaio de um show, as coisas começaram a dar certo para o pessoal do Grupo Base mais Ary Rongel, pois hoje era o dia do ensaio da chegada do presidente da república à Ilha Rei George (calma – apenas ensaio !).
Pouco depois do almoço, todos uniformizados (Grupo Base) e perfilados na frente da estação (foto), quando começou a sobrevoar a área um dos helicópteros do Brasil. O Almirante secretário da CIRM desembarcou para acompanhar a visita da comitiva preparatória da visita do Presidente. Nesse momento eu soube que a data de meu embarque definitivo no Ary Rongel estava marcada para as 19hs.

Calmamente eu terminei de fechar todas as minhas coisas (pela 3º vez !!) e fiquei de prontidão, mas sem correrias. E depois de tanto stress com o termino da Operantar para mim, eu precisava de um pouco de ar. Mariana, Paulo e eu decidimos então dar uma pequena e rápida volta no entorno da estação. Grandes blocos de gelo estavam encalhados na praia, e andamos pelo antigo terreno da Base G, módulo VLF, cruzes, até chegar no alto da colina atrás da estação. Uma bela vista com toda certeza !

Quando retornamos à estação, já se passava de 17:30 hs. Então troquei de roupa, larguei os marfinites com todas as coisas na praia, coloquei o mustangue laranja (roupa oficial de transporte no bote) e saí, sem despedidas, da estação. Eu sinceramente não queria e não gosto de despedidas. A única pessoa com quem eu realmente falei e me despedi sinceramente foi a minha querida Janaina. Não tenho vergonha de dizer que chorei muito, mas muito mesmo (culpa sua, Jana rsrsrs) e sai com a certeza absoluta de que iria voltar, talvez em um ano, talvez mais....mas iria voltar. Esse é meu lar e dessa água de degelo eu bebi. As pessoas com certeza serão outras e as skuas também, mas velhos amigos encontrarei novamente e as rochas onde eu pisei estarão lá me esperando, na minha casa de pedra.

Depois dessa foto (acima) com Janinha na praia a coisa toda foi bem rápida. O “big krill” chegou (o bote do Ary), carregamos tudo e alguns amigos vieram até a praia para dar adeus. A seqüência abaixo é exatamente isso- Adeus, Ferraz ! Na praia, Janinha, Doc, Jussara, Mariana, Santos, Stauffer e Ferreira.

Em apenas 40 segundos atravessamos os 300 metros que separam Ferraz do Ary Rongel, minha nova casa pelos próximos dias. Um pouco diferente do que da minha última Operantar em 2000, mas essencialmente o mesmo ferro vermelho singrador dos mares polares. Eu tenho um carinho muito grande por esse navio e é com muito orgulho que farei mais um Drake com ele. Minhas coisas ainda estão dentro de marfinites e estou dormindo sobre o mustangue no laboratório à ré do barco, pois estamos em plena faina de coleta de água. Na verdade, vim para o navio exatamente para isso: apoio ao projeto da Priscila, na coleta de água à cada 3 horas durante as próximas 24 horas.

Na foto abaixo, a alegria dela depois da segunda coleta com sucesso. O difícil está sendo dormir nesses intervalos quebrados e o frio do laboratório. Não vejo a hora de dormir confortavelmente em uma cama por pelo menos 12 horas.

Não sei quando poderei postar de novo. Além do trabalho cansativo tem a conexão que as vezes não funciona aqui pela distância e rigores do tempo. Enfim....estou retornando ao Brasil, com saudades de todos e principalmente da minha Mariana. Mas ao mesmo tempo sei que no meio do Drake vou sentir novamente aquela sensação de “deixar meu lar”, que agora é aqui, nessa imensidão de gelo.

Até a próxima....